Sem sinais claros de que os Estados Unidos estão dispostos a negociar, o governo brasileiro se prepara para a entrada em vigor, a partir desta sexta-feira, 1° de agosto, da tarifa de 50% sobre todas as suas exportações para o mercado americano. Se o quadro se confirmar - e essa é a expectativa no Palácio do Planalto neste momento -, o país receberá o percentual mais punitivo aplicado pela Casa Branca.

Contêineres são vistos no porto do Rio de Janeiro, em 10 de julho de 2025.
Foto: REUTERS - Pilar Olivares / RFI
Vivian Oswald, correspondente da RFI no Rio de Janeiro
Diante deste cenário, o presidente Lula receberá da equipe econômica em até 48 horas um leque de medidas que deverão compor o plano de contingência que está sendo desenhado para enfrentar o tarifaço. A ideia é criar uma espécie de "válvula de escape para os setores mais atingidos", nas palavras de fontes do governo ouvidas pela RFI.
Neste início de semana, uma missão de oito senadores brasileiros se encontra em Washington. O grupo da Comissão Temporária Externa começa nesta segunda-feira (28) uma agenda para tentar convencer parlamentares e empresariado a se mobilizar pelo caso brasileiro. Eles ficam nos Estados Unidos até o dia 31 de julho, a véspera do tarifaço. O Congresso americano está em recesso, antecipado por conta das denúncias do caso Epstein que envolvem o nome de Donald Trump. A pausa foi decidida para ajudar a decantar o cenário político.
Na Escócia, onde anunciou ter chegado a um acordo com a União Europeia, Trump afirmou que não pretende adiar o prazo de sexta-feira dado aos países com quem não chegou a um entendimento, o Brasil entre eles, para a aplicação das tarifas de reciprocidade. O setor produtivo brasileiro queria uma prorrogação. A China provavelmente terá 90 dias adicionais.
"Caça às bruxas"
A Casa Branca condicionou a negociação à interferência do Executivo no processo contra Jair Bolsonaro que está no Judiciário. Trump falou em caça às bruxas. Do lado brasileiro, que se diz disposto a negociar toda a pauta comercial, se necessário, esta questão é inegociável, pois interfere na soberania e na autonomia dos poderes em uma democracia. O impasse, segundo disseram essas fontes à RFI está no fato de a carta enviada por Trump ao Brasil, com o aviso da cobrança da tarifa, não dar margem a uma terceira via.
Na semana passada, o vice-presidente Geraldo Alckmin, que foi designado por Lula para tratar do tema, falou com o secretário de Comércio americano, Howard Lutnick, dispondo-se a negociar. Alckmin propôs aumentar o comércio entre os dois países, ampliar a integração econômica com mais investimentos e até um acordo de bitributação. Ainda assim, não teve resposta. O caso estaria nas mãos da Casa Branca, que concentra cada vez mais poderes. Lula disse na última sexta-feira que Alckmin busca todos os dias contatar um interlocutor do governo americano.
A União Europeia acabou cedendo. Neste domingo, o bloco negociou uma tarifa de 15% e não 30% sobre bens que o americano havia previsto. Mas fez várias concessões, como a de se comprometer a comprar US$ 750 bilhões em energia dos americanos para substituir o gás russo, e a investir US$ 600 bilhões a mais do que o previsto nos Estados Unidos. Além disso, ainda que automóveis e produtos farmacêuticos tenham ficado na tarifa de 15%, continua valendo a de 50% para aço e alumínio. A presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, disse que foi o melhor acordo que conseguiu. Trump, que a recebeu no seu campo de golfe na Escócia, afirmou que foi o maior acordo de todos os tempos. Ainda há detalhes a serem discutidos.
Laranja pode abrir precedente
O governo brasileiro continua insistindo que quer negociar, desde que sem viés político ou ideológico. A expectativa de fontes ouvidas pela RFI neste final de semana é a de que a disputa com os Estados Unidos deve entrar em "um longo período, que começa no dia 1° de agosto, quando passam a valer os 50%, até a eleição presidencial de 2026". Diante disso, o presidente Lula receberá da equipe econômica em até 48 horas um leque de medidas que deverão compor o plano de contingência que está sendo desenhado para enfrentar o tarifaço. Entre elas, linhas de crédito. A ideia é evitar a pressão por mais gastos fiscais.
Paralelamente, o governo brasileiro e empresas que operam nos dois países aguardam a decisão de um tribunal americano, após uma distribuidora de suco de laranja, baseada em Nova Jersey, ter entrado com uma ação para obter uma liminar suspendendo o tarifaço do Brasil, que pode inviabilizar o seu negócio. A depender da decisão judicial, outras empresas podem ver um grande precedente para buscar o mesmo caminho.
https://www.terra.com.br/noticias/brasil/brasil-a-beira-do-tarifaco-confronto-comercial-com-os-eua-se-intensifica,72bdbb9bd99ccf02fd755ca85e27a0b9iw52deqp.html?utm_source=clipboard