Porto Velho, RO – Um relatório recente de segurança e meio ambiente, elaborado pela ABIN, FBSP e MMA, confirma que o estado de Rondônia assumiu uma posição crítica no esquema de contrabando de mercúrio. O estado atua como o principal corredor de entrada do metal tóxico que alimenta a mineração ilegal em toda a Amazônia Legal. O estudo detalha como o crime organizado utiliza a fronteira do estado para movimentar o produto da Bolívia para o interior do país.
A principal porta de entrada do mercúrio no Brasil está concentrada na área de fronteira entre a Bolívia e o município de Guajará-Mirim, em Rondônia.
O metal pesado, importado legalmente em grande volume pela Bolívia, é desviado por redes criminosas para o território brasileiro. O contrabando ocorre sobretudo pelo Rio Mamoré, onde o mercúrio é transportado em pequenos frascos a partir de Riberalta, na Bolívia. A fragilidade da fiscalização na fronteira transformou a região em uma "torneira clandestina", escoando o produto para as organizações que exploram o ouro ilegalmente.
Principais pontos de entrada e rodovias utilizadas para contrabando de mercúrio na fronteira entre Bolívia e Rondônia
O centro de distribuição do contrabando
Após cruzar a fronteira, o roteiro do mercúrio converge para a capital. Porto Velho funciona como o principal hub logístico para a redistribuição do metal.
Da capital rondoniense, o material é transportado para suprir as grandes áreas de garimpo da Amazônia, com destaque para:
As balsas e dragas que atuam intensamente no Rio Madeira, abrangendo tanto Rondônia quanto o Amazonas.
O Rio Tapajós, no Pará.
A movimentação intensa confirma que o esquema de tráfico possui uma estrutura organizada e transnacional.
Contaminação crônica do Rio Madeira e consequências severas na saúde
O relatório reforça um problema já conhecido por estudos regionais: a contaminação por mercúrio nos rios e na cadeia alimentar. O Rio Madeira, vital para Rondônia, sofre intenso lançamento do metal líquido no processo de garimpagem do ouro há décadas.
Danos Neurológicos e Risco Infantil: O problema é que o mercúrio se transforma em metilmercúrio, uma neurotoxina potente que se acumula no organismo pelo consumo de peixes contaminados. Estudos realizados na região confirmam que a maioria dos moradores ribeirinhos e indígenas apresenta níveis de mercúrio no cabelo acima do limite seguro estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
A exposição pode causar danos permanentes, como tremores, perda de memória, problemas de coordenação motora e, o mais grave, graves danos cerebrais em fetos e crianças.
Dificuldade na legalização e alternativas tecnológicas
Apesar do desejo de alguns setores pela legalização, a lei federal proíbe o uso de mercúrio na mineração de ouro (Lei nº 13.576/2017). Além disso, a legalização de atividades de garimpo no Rio Madeira é tecnicamente inviável, pois grande parte das operações com balsas e dragas ocorre em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e causam danos ambientais como assoreamento.
A solução defendida pelos especialistas e órgãos ambientais passa pela transição tecnológica:
Adoção de Métodos Limpos: Incentivo ao abandono do mercúrio e o uso de tecnologias limpas, como centrífugas.
Foco em Áreas Terrestres: Proporcionar capacitação e financiamento para que os garimpeiros migrem para cooperativas terrestres, onde a lavra pode ser licenciada com menor impacto ambiental e com o uso de tecnologia segura.
Resposta institucional e fiscalização
Em resposta a esse cenário, os órgãos produtores do relatório e a Justiça têm intensificado a cooperação. O Ministério Público Federal (MPF) avança com o projeto "Rede Sem Mercúrio", buscando bloquear a venda do produto em plataformas digitais.
Ao mesmo tempo, a Polícia Federal e o IBAMA continuam as operações de campo no Rio Madeira, como a Operação Uiara II, que tem como foco a destruição de dragas e equipamentos ilegais, visando desarticular a estrutura do garimpo.
Redação Diário O Norte
